Nas últimas décadas viu-se um crescimento na abertura de novas empresas no Brasil, sendo que, segundo dados do mapa das empresas do Ministério de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, o Brasil registrou mais de 2,350 milhões de novos registros no cadastro nacional de pessoa jurídica (CNPJ)¹ apenas entre janeiro e julho de 2023.
Essa evolução histórica na abertura de novas empresas impactou diretamente o ramo imobiliário e o direito contratual nacional, haja vista que tanto do ponto de vista financeiro quanto do operacional, pode haver dificuldades para os empresários em encontrar o imóvel correto para que se possa desenvolver completamente a atividade comercial pretendida. Isso ocorre, pois, alguns negócios precisam de uma localização ou estrutura específicas.
Com isso, visando atender aos anseios dos empresários brasileiros em poder ter meios menos onerosos e burocráticos para obter um espaço físico adequado para o seu empreendimento, houve a exportação de um instituto iniciado no Direito norte-americano, especificamente pela empresa Walmart, chamado de contrato de locação não residencial Built to Suit (BTS).
O termo Built to Suit vem do inglês, e significa “construir para servir” ou “construir para se adequar”. Dessa maneira, o que se extrai do termo é a ideia de construir para adaptar frente a uma determinada necessidade.
Nesse sentido, a doutrina assim define tal modalidade contratual²:
“Um modelo de negócio jurídico no qual a parte interessada em ocupar um imóvel para o desenvolvimento de uma atividade (contratante) contrata com um empreendedor: (i) a construção, pelo próprio empreendedor ou por terceiros, de um empreendimento (edificação) em um determinado terreno (imóvel) e/ou a sua reforma substancial, de forma a atender as especificações e os interesses da contratante; e; após o término da construção ou reforma substancial, (ii) a cessão do uso e fruição (locação) do terreno com o empreendimento, por um valor que permita ao empreendedor remunerar a quantia investida na execução da obra, bem como o período de uso e fruição do imóvel, de modo a lhe proporcionar certa margem de lucro”.
A princípio, era um contrato atípico que possuía características próprias que o distinguiam da locação comercial, e que foi acolhido pela jurisprudência, sendo reconhecido no julgamento do Recurso Especial nº 885.910³. Tal situação de atipicidade foi alterada com a edição da Lei 12.744/2012, que modificou o artigo 4º da Lei 8.245/1991, bem como incluiu, na mesma legislação, o artigo 54-A, ambos visando a regulamentação dos contratos Built to Suit, ou, conforme a expressão que consta na legislação, contratos de construção ajustada.
Resumidamente, nos contratos Built to Suit (BTS), o locador realiza investimento em imóvel de sua propriedade para nele edificar ou mesmo para incluir reformas substanciais, de modo que o referido imóvel atenda às necessidades previamente estabelecidas pelo locatário.
Portanto, o espaço é customizado de forma que o locatário não tenha que arcar com os custos desta adaptação, podendo, de tal forma, utilizar o capital que seria investido no espaço físico em suas atividades-fim, otimizando seus resultados, sendo esta a principal vantagem para a empresa que está alugando o espaço modificado para atender suas necessidades.
Já para o locador, as principais vantagens desse tipo de contrato é que os valores gastos com a aquisição do imóvel, construção ou reforma substancial serão somados aos valores de mercado dos aluguéis, surgindo novo valor mensal a ser pago pelo locatário a título de locação, normalmente sendo um valor mais elevado que de um contrato de locação comum e a garantia de que o imóvel ficará alugado por um longo período, pois existe uma determinação legal que determina que esses contratos devem ter uma duração mínima (em média de 10 a 20 anos) capaz de garantir o recebimento, pelo Locador, dos aluguéis mais a somatória dos gastos que o mesmo teve com a compra do imóvel, ou com a construção ou, ainda, com a reforma substancial.
Ademais, outra vantagem para o locador advém do fato que o §2º, art. 54-A da Lei 8.245/1991 prevê que caso o Locatário rescinda o contrato antecipadamente este terá que arcar com uma multa, que poderá ser equivalente à soma dos valores dos aluguéis a receber até o termo final da locação, assim, a multa deixa de ser proporcional (e no valor normalmente convencionado de três aluguéis), como é no caso de contrato de locações não residenciais convencionais, e passa a ter seu limite no valor da soma dos aluguéis que iria receber até o final do contrato.
Luiz Felipe Araújo Moreira
OAB/AM 16.478
Referências
[1] Censo de novas empresas disponível em: https://www.gov.br/empresas-e-negocios/pt-br/mapa-de-empresas/painel-mapa-de-empresas
[2] BENEMOND, Fernanda Hennenberg. Contratos built to suit. Coimbra: Almedina, 2013, p. 24.
[3] (STJ – REsp: 885910 SP 2006/0144180-0, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 15/04/2008, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 05/08/2008)